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segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

TEMBÉ COMEMORAM REINTEGRAÇÃO DE POSSE EM ÁREA INDÍGENA INVADIDA POR COLONOS HÁ 40 ANOS


Área conhecida como Fazenda Mejer foi invadida em 1974 e só nesta quinta-feira, 19 de dezembro, foi devolvida aos indígenas

Os indígenas Tembé foram reintegrados nesta quinta-feira, 18 de dezembro, na posse da área de 9,2 mil hectares conhecida como fazenda Mejer, em Nova Esperança do Piriá, no nordeste do Pará. O retorno à área é conquista de iniciativas dos Tembé, do Ministério Público Federal (MPF) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) realizadas em defesa dos direitos indígenas desde que o local foi invadido, em 1974.

“Nosso povo está em festa”, comemora uma das lideranças dos indígenas Tembé, Puyr Tembé, ao falar sobre a reintegração de posse, enfatizando que a vitória não é apenas dos caciques, e sim de toda a etnia. “Foram lutas árduas travadas não só pelas lideranças, mas também pelos jovens e pelas mulheres indígenas”, destaca.

Uma dessas lutas ocorreu no último dia 1º, quando houve conflito entre os Tembé e não índios ocupantes de áreas indígenas. No caso da Vila Livramento, onde ocorreu o tiroteio do início do mês, os colonos foram atraídos pelo fazendeiro Mejer Kabacznic, que invadiu a área dos índios em 1974 e conseguiu abrir uma estrada, por onde outros invasores entraram.

No início desta semana, o MPF encaminhou à Justiça a informação de que os invasores haviam se retirado do local, e pediu o cumprimento da sentença que determinava a reintegração de posse aos indígenas. O mandado foi expedido na quarta-feira, 17 de dezembro, e cumprido ontem, com a presença de representantes do MPF, Funai e Polícia Federal no acompanhamento a indígenas e oficiais de Justiça.

Na área invadida conhecida como fazenda Mejer ou fazenda Irmãos Coragem o Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do Trabalho e Emprego flagrou, em 2004, um grupo de 37 trabalhadores – inclusive menores de idade – reduzidos a condições semelhantes às de escravos. O MPF denunciou o fazendeiro Samuel Kabacznik pelo crime. O condenado recorreu da sentença e aguarda decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília.

Comemoração

O sentimento dos Tembé é de que eles conseguiram garantir às futuras gerações a manutenção de um direito que sempre foi e sempre será pertencente aos indígenas, explica Puyr Tembé. Outra liderança indígena, Almir Tembé, considera que a notícia da retomada da área vai servir de fonte de força e esperança para outras lutas indígenas dos Tembé e de outras etnias. “Seja qual for a etnia, certamente verá nessa reintegração de posse uma prova de que vale a pena lutarmos por nossos direitos”, afirma Almir Tembé.

Assim como os Tembé, a Funai também está em festa, diz o coordenador técnico da instituição em Belém, Juscelino Bessa. Segundo ele, assim como a invasão de 1974 pelos Mejer Kabacznik foi indutora de várias outras invasões menores, provavelmente a reintegração dessa área vai estimular a saída também dos pequenos invasores, e a área que deve voltar à posse indígena deve chegar a cerca de 14 mil hectares. “Antes diziam que nós só mexíamos com os pequenos, mas em 2007 passamos a focar nossas ações na retirada dos invasores de áreas de médio porte e essa situação mudou”, relata.

Bessa considera que a reintegração de posse aos Tembé é uma das maiores vitórias para a causa indígena no Brasil, porque é uma das maiores recuperações de terra e um dos processos mais antigos. Segundo ele, a ação de reintegração de posse é de 1979, cinco anos depois que os Kabacznik cortaram a TI de leste a oeste para ligar a sede de uma fazenda à localidade conhecida hoje como Livramento.

A data é histórica também segundo a procuradora da República Nathália Mariel Ferreira de Souza Pereira, que representa o MPF no processo. “Para os indígenas, a garantia da terra é mais que a garantia da subsistência. É a preservação da cultura, dos saberes e do modo indígena de lidar com o mundo. Mais que a retomada de uma área que nunca deixou de ser Tembé, a reintegração da posse é uma mostra de respeito à vida de todos os povos indígenas”, detalha.

Desafios

Como cerca de 70% da área foi transformada em pasto pelos invasores, o desafio agora é planejar o reflorestamento do território, conta Puyr Tembé. “A criação de gado não faz parte da nossa cultura, então teremos que repensar a utilização dessa área”.

Em 2007 os indígenas entraram na Justiça Federal no Pará com ação em que pediam que a Justiça obrigasse a União a indenizá-los pelos danos ambientais provocados em área indígena pelos invasores. A Justiça Federal negou atendimento ao pedido do e os indígenas recorreram da decisão. O caso aguarda julgamento no TRF-1.

Segundo a líder Puyr Tembé, os indígenas estudam entrar com ação contra a Kabacznik, também para pedir indenização pelos danos sociais e ambientais provocados. “É uma família que fez riqueza em cima de terras que não eram dela, eram nossas”, denuncia.

Histórico

A Terra Indígena (TI) Alto Rio Guamá, com pouco mais de 279 mil hectares, é uma das mais antigas da Amazônia e teve o território reconhecido em 1945 por Magalhães Barata, então governador do Pará. Em 1988, durante o processo de demarcação federal, o ministro da Reforma Agrária à época, Jader Barbalho, dividiu a terra dos Tembé, criando vilas agrícolas no meio do território indígena e criando o terreno para as invasões em vários pontos.


Em 1993, a divisão feita por Barbalho é anulada e a TI Alto Rio Guamá tem a demarcação definitiva homologada pelo governo federal, em toda sua extensão. Mesmo assim, até 2014, as consequências dos erros governamentais provocam situações de conflito como a do último dia 1º de dezembro.



Fonte: MPF – Ministério Público Federal

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